A Paraíba tem a segunda maior produção do grão de fava ou fava feijão do Brasil. De acordo com a última pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2023 foram colhidos 3,3 mil toneladas do produto, ficando atrás apenas do estado do Ceará, que teve uma produção de 3,5 mil toneladas. Só em solo paraibano, agricultores familiares de 123 municípios trabalham com o grão.
A fava é cultivada principalmente no Nordeste brasileiro, possuindo boa adaptação à região semiárida. Na Paraíba, a semente é plantada em várias regiões do estado, sendo predominante no Brejo e Agreste, que compreende o bioma da caatinga e a floresta ombrófila aberta. A produção é totalmente da agricultura familiar e não há registro de uma produção em larga escala. A maioria dos produtores tem apenas um hectare de área plantada e geralmente estão em consórcio com outras culturas, como o milho.
O município de Alagoa Grande, no Brejo paraibano, a 110 km de João Pessoa, tem a maior produção do grão do estado. Em 2023 foram colhidas 1,0 mil toneladas do produto. A mesma quantidade foi colhida em 2022 e 2021. De 2018 a 2020, a produção chegou a 2 mil toneladas cada ano.
O grão também é cultivado fortemente em outros municípios do estado, que atingiram juntos, em 2023, cerca de 798 mil toneladas das sementes. São eles: Mogeiro (240 t.), Queimadas (225 t.), Campina Grande (125 t.), Massaranduba (108 t.) e Esperança (100 t.).
São nesses municípios que o proprietário de um box no Mercado Central, no centro de João Pessoa, Antônio Carlos Silva, compra cerca de quatro sacas de fava por semana para revenda. No local, podem ser encontradas cinco tipos do grão: a rajada ou lavadeira, cara larga, branca, raio de sol, vermelha e cearense, que ganha destaque na exposição dos produtos.
“As mais procuradas são a fava branca e a fava rajada (lavadeira). São mais consumidas pelos clientes e compradas pelos restaurantes da cidade. Já as do tipo vermelha e cearense a procura é menor, devido a textura e gosto diferentes das demais, mas também suas cores deixam qualquer prato de encher os olhos”, comenta Antônio.
Só no box do feirante, são vendidas duas sacas por semana, com o quilo custando R$20. Além dos clientes diários, Antônio vende para restaurantes que chegam a comprar até uma saca de 60 quilos por semana ou a cada 15 dias, mesmo com o preço mais elevado. Para os estabelecimentos a saca é vendida em torno de R$1.080, com o preço do quilo variando de R$17 a R$18.
De acordo com o comerciante, o valor mais ‘salgado’ é devido ao período de entressafra. “Estamos na entressafra e vendendo fava do ano passado e produzidas no começo deste ano. Esse ano não teve uma boa colheita, mas ano passado deu uma boa safra. Quando se tem um bom período de chuva, que é o principal fator para o sucesso do plantio da fava, se tem consequentemente uma boa colheita. O agricultor aproveitou a quantidade generosa da produção do ano passado e guardou os grãos. Eles esperam o melhor preço de venda no ano seguinte, por isso que os preços estão mais altos no momento. Em tempo de boa colheita o quilo chega a custar no máximo R$13 para o cliente final”, frisou o feirante.
Pesquisa
Miguel Barreto Neto, pesquisador da Embrapa Algodão, localizada em Campina Grande, trabalha há mais de 15 anos com a fava e já publicou mais de 20 títulos relacionados ao cultivo e produção das sementes. De acordo com Barreto, o principal período de plantio da leguminosa ocorre nas primeiras chuvas de cada região. No Sertão, por exemplo, esse período é de janeiro a fevereiro, enquanto na região do Agreste e Brejo o plantio vai de fevereiro a abril.
A colheita vai do mês de maio a agosto e geralmente tem duração de quatro a cinco meses. Os agricultores produzem suas próprias sementes e guardam seu estoque para o plantio da próxima safra. A estratégia ocorre devido ao alto valor da fava no mercado.
Um quilo de fava pode chegar até R$25,00 em média nas feiras livres. Para plantar um hectare são necessários 20 quilos, já que em cada cova são utilizadas três sementes, o que equivale a um investimento de mais de R$500. Dessa forma o custo para os agricultores familiares sairia muito alto para um produção que muitas vezes não tem um bom resultado.
De acordo com Barreto, a feira de Campina Grande, localizada na área Central da cidade, é um local representativo da fava na Paraíba, por conter uma grande variedade de tipos e tamanhos da semente.
“Apesar das famílias não consumirem todos os dias, o cultivo é sustentável já que a atividade não exige umidade. Se após a floração o tempo for seco, a planta se adequa e consegue desenvolver suas vagens no tempo seco. A fava é uma cultura muito promissora e pode ser introduzida em outras atividades agrícolas, garantindo um bom lucro e pouca preocupação com o manejo da plantação”, detalhou.
O pesquisador detalha que a planta pode ter dois formatos, o de crescimento indeterminado, que tem uma ramagem mais longa e na maioria das vezes é cultivada junto ao pé de milho e isso ajuda os agricultores na economia dos espaços no terreno plantando duas culturas. Outro formato é o moita, que tem um crescimento menor e arredondado.
Estudo
A Embrapa, por meio dos Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília, DF), divulgou o Catálogo de Fava (Phaseolus lunatus L.) Conservada. A publicação tem informações detalhadas sobre as espécies dos grãos encontrados nos biomas da Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa, Pantanal e Amazônia.
Na região da caatinga da Paraíba foram catalogadas pela instituição 14 tipos de fava cultivadas nas cidades de Campina Grande (tipo cearense), Juarez Távora (t. branca), Alagoa Grande (t. Pacatuba), Areia (t. olho verde), Esperança (t. moita), Alagoa Nova (t. cara larga), Matinhas (t. coquinho, eucalipto), Mogeiro (t. manteiga). Só no município de Queimadas são produzidos cinco tipos: galo de campina, preta, boca de moça, lavadeira e a orelha de vó.
Culinária
A fava é apreciada no mundo inteiro e destaca-se pelo seu sabor suave e amanteigado. De acordo com os estudos da Embrapa, entre os nutrientes encontrados no grão, estão: proteínas, fibras, ácido fólico (vitamina B9) e antioxidantes. Contém também zinco, potássio, manganês, fósforo, ferro, cobre e tiamina (vitamina B1). Além do Brasil, a semente é consumida na América Latina, nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia.
Na Paraíba, o consumo da leguminosa pode ser verde, madura ou seca e é servida em diversos pratos nos restaurantes. Um desses estabelecimentos é o Bar do Flávio, localizado no bairro de Manaíra, em João Pessoa, a favada, como muitos chamam, tem destaque no cardápio. Desde quando o restaurante abriu, em 2009, o prato é servido no local.
A receita leva carne de charque, bucho e barriga de porco e temperos. Ao ser servido, o prato é incrementado com charque e tripa assadas, sendo um dos petiscos mais vendidos no restaurante.
De acordo com um dos proprietários do Bar, Flávia Bulhões, para dar conta da demanda dos pedidos são compradas uma saca de 60kg de fava ao Antônio Carlos, feirante do Mercado Central, citado no início da reportagem.
“Compramos a saca da semente seca, há seis anos no mesmo fornecedor, esse é um dos pontos fortes da nossa receita. Desde o início a fava sempre foi bem aceita pelos clientes , com uma ótima saída, até hoje é o petisco mais pedido. Abrimos em março de 2009 e sempre tinha o prato no cardápio, no início vendíamos apenas favada e depois acrescentamos charque e tripa no mesmo pirex, e fez o maior sucesso”, concluiu Flávia.
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